Pesquisa apresenta dados sobre casamento na infância no Brasil

Por: Mayara Penina
Ela vai no meu barco: Casamento na Infância e Adolescência no Brasil

A pesquisa “Ela vai no meu barco: Casamento na Infância e Adolescência no Brasil” apresenta dados sobre esta prática ainda pouco discutida no Brasil. Quando se fala em casamento na infância pensa-se em cerimônias ritualística de culturas Asiáticas ou da África Subsaariana envolvendo a imposição do casamento a crianças com homens mais velhos. No Brasil, essa prática se apresenta de maneira naturalizada e em uniões informais, envolvendo, em geral, meninas na fase da infância/adolescência com homens adultos, em média 9 aos mais velhos, como uma alternativa da jovem frente a opções limitadas de vida.

A pesquisa realizada pelo Promundo, ONG que desde 1997 estuda questões de gênero, em parceria com a Universidade Federal do Pará e da Plan International Brasil buscou analisar as atitudes e práticas em torno do casamento infantil nos dois Estados brasileiros de maior prevalência: Maranhão e Pará. De acordo com o Censo de 2010, 88 mil meninas e meninos estão em uniões consensuais, civis e/ou religiosas, no Brasil. Cerca de 11% das mulheres brasileiras com idades entre 20 e 24 anos se casaram antes dos 15 anos e 36% do mesmo grupo casaram antes dos 18 anos (PNAD). Apesar dos números significativos, poucas políticas e nenhum outro estudo têm abordado a problemática do casamento na infância e adolescência no Brasil.

O estudo aponta que as motivações para o casamento passam por diversos fatores, entre eles: gravidez indesejada, controle da família sobre a sexualidade das meninas, busca por segurança financeira, desejo das meninas de abandonarem a família e/ou situação de opressão familiar, desejo por maior autonomia e o desejo dos maridos em se casar com meninas mais jovens.

Essas motivações estão relacionadas a dimensões da desigualdade de gênero que apresentam papeis distintos para homens e mulheres na sociedade, reservando para eles o papel de seres ativos e provedores e para elas o papel de cuidado (do lar, filhos e do marido) e de conformar as preferências e necessidades do marido, acima dos desejos dela.

A pesquisa aponta que os casamentos na infância e adolescência são marcados por relações desiguais de poder entre marido e esposa o que  gera consequências como o afastamento da escola, do mercado de trabalho, consequências para a saúde sexual e reprodutiva, para a saúde materno-infantil e restrição da mobilidade das meninas. “Muitas pensam que casando vão ter a liberdade que não encontram nas famílias, mas a pesquisa mostra que a situação do casamento só aumenta o controle sobre elas”, afirma AliceTaylor, coordenadora da Pesquisa.

Assim, a educação para a equidade de gênero apresenta-se como uma estratégia importante de garantia de direitos de crianças e adolescentes que atualmente está sendo ameaçada pela PL 2731/2015 que entrou em agosto em circulação na Câmara dos Deputados. A PL 2731 altera os Planos Nacionais de Educação para “dispor sobre a proibição do uso da ideologia de gênero na educação nacional.” De acordo com o projeto de lei, não deve ser papel da escola “doutrinar” sexualmente as crianças e ainda orienta os Estados, o Distrito Federal e os Municípios a adequar seus planos de educação segundo essa lógica.

A falta de opções substanciais e a alta vulnerabilidade apontada pela pesquisa como fatores que empurram as adolescentes  para o casamento nos permitem questionar sobre o papel que os órgãos e instituições de garantia de direitos de crianças e adolescentes estão desempenhando para cumprir sua missão. Lucia Lima, pesquisadora de campo no Pará, aponta que em algumas entrevistas as meninas apresentam como motivação para o casamento o desejo de se “livrar” da escola, por exemplo.”Enquanto educadora fico me questionando que escola é essa que estamos oferecendo para as crianças e adolescentes?”

A educação para a equidade de gênero e o empoderamento das meninas foi apresentado por Mario Volpi, do UNICEF, como um caminho para o enfrentamento das consequências desta prática. ‘Precisamos ressignificar os papeis na sociedade e não apenas no âmbito individual ou familiar. Precisamos gerar uma contra-tendência (nas relações de gênero) e, sobretudo, empoderar as meninas”, disse.

Com informações do Instituto Promundo