Para colunista, mãe que fica em casa ‘torna a família mais rica’

O consultor financeiro e escritor Gustavo Cerbasi escreveu em sua coluna na Época no dia 3 de julho, quarta-feira, que “não é exagero afirmar que uma mãe em casa vale em torno de R$ 10 mil a R$ 12 mil por mês” e que “a presença da mulher em casa significa maior capacidade de gerenciar e cuidar da família.  Em outra parte do texto afirma que se a mãe “fosse substituída por bons profissionais, custaria quase sempre mais que o salário do qual essas mães abrem mão”.

O texto e as afirmações contidas na coluna causaram repercussão nas redes sociais e muitas mulheres criticaram as ideias do escritor. Por isso, para pensar sobre as afirmações de Cerbasi convidamos mulheres e mães envolvidas com o tema para comentar.

Colunista da Revista Época.

Para Camila Conti, fundadora da Maternativa, plataforma que fomenta e discute o empreendedorismo materno, o autor do texto reforça diversos estereótipos de gênero que aprisionam as mulheres.

“Ao afirmar que uma mãe em casa ‘vale’ de R$ 10 a R$ 12 mil mensais associando sua presença aos ‘custos’ dos serviços domésticos, o autor do texto reforça diversos estereótipos de gênero que aprisionam as mulheres há séculos e dissocia, mais uma vez, a responsabilidade masculina no que diz respeito aos cuidados com a casa e com os filhos. Também é preocupante sua afirmação de que as mulheres ganham menos – não por um problema sistêmico – e sim, porque a gravidez é um ‘risco’ associado ao gênero que dá ao empregador o direito de pagar menos, como se os homens também não tivessem filhos”

Em resumo: “para ele as mulheres valem mais em casa do que no mercado de trabalho e ao citar que isso é um “resgate da tradição”, percebemos como ainda temos um longo caminho a percorrer e como o feminismo ainda se faz muito necessário para que possamos alcançar, de forma real, a igualdade de gênero em todos as esferas da sociedade”.


Fizemos a mesma pergunta para a professora e linguista Danyelle de Oliveira Santos, autora do blog Quartinho da Dany e ela frisou que é importante, antes de tudo, entendermos de quem é esta fala:  “um homem que é escritor, consultor financeiro e palestrante”.

Não há, aparentemente, nenhum problema com esse perfil e nenhuma intenção em criticá-lo, mas precisamos considerar que é alguém que, muito provavelmente, nunca precisou escolher entre ser do lar ou trabalhar fora.

Por isso, em sua análise, é bastante confortável afirmar que existe alguma liberdade de escolha para as mulheres sem realmente saber o que significa ser mulher e mãe em um mundo que torna essas mulheres invisíveis na sociedade e que muitas delas não estão em casa por opção, mas por ser a única alternativa, já que o cuidado dos filhos, infelizmente, ainda recai exclusivamente sobre a mãe.

“Em uma tentativa de valorizar a figura materna do lar, o autor chega a precificar o trabalho ignorado e desvalorizado dessas mulheres. Certamente é mais fácil tentar determinar algum valor para esse serviço doméstico e materno, que é solitário, que fazer algumas outras perguntas importantes: Por que a maioria das mulheres mães estão em casa? Por que muitas das mães são demitidas após o fim da licença-maternidade? Por que apenas as mães precisam responder com quem os filhos ficarão em entrevistas de emprego?”

Danyelle, que é mãe de dois filhos, rebate a afirmação de Gustavo quando ele diz que uma mãe em casa sem ganhar de R$ 10 mil a R$ 12 mil por mês não representa necessariamente ganho em bem-estar: “Uma mãe em casa significa uma mulher sem a própria renda, o que lhe possibilitaria mais independência e a possibilidade de ter, no futuro, uma aposentaria justa.

“Uma mãe em casa reflete a desigualdade entre gêneros (por quê não os homens?).”

“Uma mãe em casa reflete a desigualdade entre gêneros (por quê não os homens?). Uma mãe em casa denuncia empresas que ainda são antiquadas e incapazes de enxergar essas mulheres como trabalhadoras completamente capazes de exercer uma função remunerada. Uma mãe em casa revela que ainda não temos políticas públicas para mulheres: licença-maternidade de, no mínimo, seis meses para manter a amamentação exclusiva e uma licença parental para que os cuidados com o bebê sejam igualmente compartilhados”.

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